sexta-feira, 20 de julho de 2012

Special K


Esse é o colapso final da comunicação humana. Nós, você e eu. Você sabe, ambos implorando por contato, por um simples olá que fosse verdadeiro. Não suporto mais esses dias frios. Esse clima irritante que paralisa todos os sentidos e a circulação sanguínea. Não suporto o espaço vazio entre as coisas e as pessoas. Não suporto essa cor azul sem graça e esses sorrisos em auto-retratos. Malditos cegos com câmeras digitais. Malditos surdos que imploram por música. Eu não estou lá, eu não estou aqui. Esse vácuo da prisão eterna que é a liberdade está me matando. Sonhos com prazo de validade, crianças velhas rastejando pelas ruas. O mundo não era assim, e se era, eu não sabia. Seu sorriso me distraía, pois eu sabia que no meio de todo o plástico aquilo era real, agora é só mais um aprisionado em uma fotografia ruim. Implorando para ser reconhecidos ou lembrados, uma vergonha. Um crime cruel mudaria tudo, ficaria escrito eternamente onde realmente importa. Sinto vergonha do que sinto, sinto ódio por odiar tudo. Não consigo mais saber se estou realmente acordado ou em um daqueles sonhos ruins. Essa insônia, esse nó infinito no estômago, essas palavras que não consigo berrar. Um beijo baby, sim, só um beijo para pôr um fim em tudo. Uma machadada na cabeça pra nos tornar felizes, um tiro no ouvido de quem diz que o amor existe. Uma fuga. Qualquer coisa que me faça sentir alguma coisa além de desprezo por nossa espécie. Me dê todo o sexo do mundo. Vamos trepar em algum lugar brilhante, vamos nos foder em público. Mostre ao mundo seu estúpido poder se se reproduzir, o poder de seduzir. Mostre ao mundo que acha que você é idiota o seu poder de destruição. Se venda por um carro, jogue fora todo o vento no rosto pelo cheiro de gasolina adulterada. Troque sua linda personalidade por um pedaço de papel sujo. Me esfaqueie, quebre sua cara em um muro e sinta o cheiro do sangue. Raspe seus seios no asfalto, me abuse. Se vingue com lágrimas, com dinamite, com o que quer que seja. Aposte na loteria, medite, me mate. Chore por ver ele ir embora pra não voltar, sorria em ver ele se acabar nas drogas e nas guitarras. Celebre com vinho o amor que ele jogou fora, chute seus dentes quando ele sorrir. Se masturbe pela manhã pensando em alguém que valeu a pena, me faça um filho. Eu sou um homem em queda, um homem celebrando a solidão no meio da multidão. Eu sou seu coração partido, eu sou o reflexo que você não reconhece no espelho. Eu sou seu talento desperdiçado em busca de aprovação alheia. Eu sou a mentira que você conta para você mesmo (a) todas as manhãs. Eu sou seu frio, externo e interno, seus medos e sua libido. Eu quero a violência, eu quero orgasmos. Eu quero uma vida banal desperdiçada no meio da fumaça. Eu quero atropelar pessoas com meu carro antigo. Eu quero te levar fazer compras e fingir estar interessado no ouro no seu pescoço. Eu quero esconder armas embaixo da cama. Eu quero quebrar seus joelhos de madrugada e arrancar seus cabelos com meu canivete. Comida enlatada e não ter onde dormir. Pegar a estrada até a gasolina acabar. Estuprar uma vagabunda e arrumar outro carro. Me risque com a caneta, me coloque um preço e me pendure em um cabide. Negue o meu nome. Me mate como quiser, me venda, me alugue, me congele, me abuse e sorria. Cada passo dado é sincronizado, cada sorriso é memorizado, cada fotografia é queimada. Me enforque. Me liberte. Por favor. É como uma galáxia chegando ao fim, uma facada no peito, um tiro no joelho. Anestesia total. Eu não posso carregar a tristeza do mundo, eu não posso carregar as esperanças de todos. Eu não pedi isso. Eu quero sentir alguma coisa. Eu quero sentir qualquer coisa. Não há ninguém, não há mais ninguém do lado de fora. Eu menti, eu nos matei com querosene. Eu queimei minha alma à toa. Eu nos joguei fora por não saber ler o manual de instruções. Eu estou vazio. Eu estou vazio. Eu sou o vazio dos seus olhos. Eu sou a fumaça que corrompe o seu pulmão. Eu sou o amor e o ódio de todas as nações.
Eu era uma criança.
Eu era vivo.
Eu sentia.

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