quarta-feira, 28 de setembro de 2011

Anyone can play guitar.

Eu andava pela rua cantando pedaços de canções que havia esquecido, repetindo infinitamente os três primeiros acordes distorcidos.Tentar esconder a transparência do tórax é uma tarefa difícil quando quase tudo se reflete no meu corpo.
Os dedos não respondiam mais como antigamente. A velha afinação em G aberto já me parecia incolor.
Mas o amor ainda estava lá. O amor quente pelo objeto frio. Na textura, nas curvas, no preto fosco destruído pelas histórias que vivemos.
Eu não lembro quando a vontade foi arrancada de mim, não lembro quando, exatamente, passei a ter medo daquilo que me trouxe até aqui. Me sinto culpado por tê-la deixado de lado, justamente quando poderia ter me ajudado a quebrar mais coisas. Mas o quê eu poderia fazer? Minhas mãos estavam amarradas ao meu rosto tentando impedir que a raiva escapasse dos meus olhos.
Essa relação de amor e ódio é o que nos move, eu preciso dela, e ela de mim. A versão definitiva de um sonho antigo, não posso negar.
Eu lembro das manchas que o meu sangue deixou nela, e de quantas vezes tive que enxugar as minhas lágrimas que sobre ela caíam.
Os tendões ainda não respondem, a memória não é mais a mesma, mas sei que essa é a hora de mais uma vez tentar a paz, restaurar a sintonia e voltar a quebrar tudo como era, sem remorso ou piedade.
Ela é o recipiente da minha crueldade. Toda a raiva e ódio foi de alguma forma transferida para aquela forma simples, e somente ela possuí a real chave que me libera dessa pequena jaula que é o meu corpo.
Ela nunca me pediu mais do que um pouco de atenção. Sempre ali, com seu corpo exposto na cama, só me esperando, mas mesmo assim, eu a matei. Duas vezes.
Eu coloquei a culpa por toda a minha frustração e desilusão nela, mas não percebi que estava culpando só outra metade de mim.
Eu sei que um pedido de desculpas não altera o que eu te fiz, nem os pedaços que te arranquei, não apaga as canções tristes que te fiz cantar e os meses que te abandonei a sua própria sorte.
Mas eu te digo: me desculpe.
Me desculpe pelo nome que nunca te dei, me desculpe por nunca agradecer por tudo que você fez por mim.
Você é minha filha, minha mulher, minha amante.
Você é minha alma, e por isso eu te amo!

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