domingo, 5 de agosto de 2012

A day in the life

Você vai acordar um dia e olhar para o lado. Você irá encontrar uma mulher que não o ama, e você também não ama ela. Você sairá da cama pequena se sentindo desconfortável, caminhando pelos corredores da casa simples que conseguiu construir ao longo de tantos anos. No café da manhã, seus filhos que não te respeitam estarão à mesa, gritando e pedindo porcarias que eles não sabem usar. Sua mulher estará na TPM, e nem de longe lembrará a garota meiga que um dia você conheceu. Você se sentirá mais desconfortável ainda.
É hora de ir para o trabalho que você odeia. Você começa a se perguntar quando foi que sua vida profissional virou um ciclo de lambeção de bolas interminável. A imagem do seu chefe obeso, babando enquanto enriquece às suas custas, te deixa enojado. Seu carro do ano financiado em 72x, não pega, e você começa a se perguntar quando foi que passou a depender de um pedaço de plástico enorme para se locomover. Seu coração começa a berrar.
Você está atrasado novamente e resolve pegar um ônibus. Ao entrar, você é sufocado pelo cheiro de pipoca doce misturado com depressão. A porcaria do ônibus está completamente lotada. Você tenta encontrar um espaço entre a porta e os seios flácidos de uma senhora. Seu estômago está se auto consumindo. Um jovem magrelo que parece ter roubado as roupas do Jô Soares liga um aparelho que um dia você conheceu como celular. Você tem vontade de esmagar o crânio dele com uma pedra.
Você resolve descer e continuar apé até o trabalho. Seus músculos provavelmente não irão aguentar a caminhada. Você não entende o trânsito. Você não entende a moda. Você não entende o que as pessoas estão ouvindo em seus carros. Você não entende porque tudo é tão alto, nem porquê as pessoas buzinam tanto. Seu pulmão parece falhar.
Você chega ao seu emprego. Exausto, e ainda são 8 da manhã. Na recepção, a secretária gostosa que você nunca irá foder te dá um bom dia de plástico. Você acha que já é o suficiente para sorrir.
Você chega em sua minúscula mesa.  Pelo menos por enquanto, você se sente feliz.
Apertar botões em um computador, por mais 8 horas. É tudo o que você precisa fazer.
Você vê seu chefe se aproximando, e prepara seu psicológico para o esporro de sempre.
Você não consegue se concentrar no que ele está dizendo, a baba caindo no paletó francês que você nunca vai conseguir comprar te distrai. Ele se foi e você não viu.
É hora do almoço. Você não deixa de comparar o refeitório da empresa com um campo de concentração nazista. Pega sua refeição e senta em um canto qualquer, implorando para que ninguém se aproxime. A comida tem gosto de pneu velho.
Durante o resto do dia você irá tentar lembrar quando foi a última vez que fez sexo. Em vão.
O expediente chega ao fim. Pensar no caminho de volta te faz vomitar.
Você entra no piloto-automático, e quando se dá conta, está parado em frente a porta de casa. Esse é o seu momento de agradecer à Deus.
Você se senta à mesa para o jantar. Seus filhos não estão em casa, e sua mulher está na sala vendo novela. Você só pensa em ir para a cama.
O quarto cheira à sexo. A cama cheira à sexo. Você não liga. Na verdade, sente pena de quem estiver fodendo a sua mulher. Ele que assuma as contas dela.
Você coloca a cabeça no travesseiro e agradece por estar vivo. Agradece por saber que é livre, e que poderá fazer tudo isso mais uma vez amanhã.
Essa é a sua vida.

A sua vida que eu recuso viver.



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